Alteração química

De um simples café ao ciclo hormonal, tudo pode mudar nosso comportamento. Uma crônica bem-humorada sobre como a química nos atravessa, mesmo quando não percebemos. Publicado no Facebook em 19/07/2018

PENSAMENTOS

Carlos do Patrocinio

8/4/20254 min read

Todo mundo, pelo menos uma vez na vida, já sofreu uma alteração química.
Pode não ter percebido ou associado ao fato, mas a verdade é que somos animais biológicos, e biologia é pura química.
A vida, na essência, são moléculas que se juntam ou se separam, transformadas em aminoácidos, vitaminas, glóbulos, e um monte de nomes que sabemos que existem porque estudamos um mínimo de biologia no primário ou já vimos no Fantástico, ou até mesmo em um episódio de CSI ou seriado investigativo semelhante.
A verdade é que tudo que está em nosso entorno, e principalmente o que ingerimos, altera de alguma forma — em parte ou no todo — nosso equilíbrio químico hormonal.

Os naturalistas acreditam que quase todos os males podem ser curados por algo extraído da natureza. Existem chás e ervas para todo tipo de mal. Erva-doce, erva-cidreira, capim-santo, camomila e tantos outros nomes que ouvimos diariamente estão associados a uma mudança de comportamento.

O café talvez seja o agente químico mais conhecido, por sua propriedade de nos deixar em alerta, evitando aquele soninho indesejável quando precisamos continuar uma tarefa. O café possui uma grande concentração de cafeína, substância encontrada em outros elementos naturais, porém mais conhecida no elixir dos deuses, como uma bruxaria negra em sua forma líquida e que atrai cada vez mais adeptos com seu aroma quase sensual, que te tira da cama ou te leva a uma salinha para, em companhia de amigos ou de forma solitária, se embriagar com aquele encanto.

A cerveja também é um grande aglutinador de pessoas. Apesar de existirem aquelas que preferem saborear um suco de cevada sozinhas, em casa ou na mesa de um bar (ou, por que não, no balcão), o grande sucesso da cerveja é a alteração química poderosa que ela provoca em um aglomerado de pessoas. Por trás de toda a euforia que ela traz, existe a participação poderosa do álcool. A coisa é tão importante de ser observada que a lei obriga a registrar no rótulo o percentual alcoólico de cada bebida, pois quanto maior a quantidade, maior a interação da substância com o organismo — e mais rápido se perceberão as alterações de comportamento da pessoa que o ingere.

Há milhares de anos, a bebida que vem entorpecendo a humanidade há mais tempo talvez seja o vinho. Apesar de mil ou dois mil anos mais velho que a cerveja, o vinho ainda perde em popularidade, mas ganha entre os que acreditam que o extrato fermentado de uva traz maior longevidade. Apesar da fama de fazer bem à saúde e de estar presente diariamente à mesa de todos os países mediterrâneos e ibéricos, o vinho também tem um percentual alcoólico que deve ser rotulado e que traz as mesmas alterações hormonais e comportamentais que todas as bebidas destiladas provocam.

A alteração do comportamento pode ser provocada de várias formas.
Não vou falar aqui, por exemplo, de clamores públicos, de coragem quando em coletivos, das massas religiosas ou qualquer alteração de comportamento provocada por qualquer tipo de cadência psicológica, seja com palavras, discursos ou canções. E sim, o cérebro estimulado pode levar o corpo a produzir suas próprias substâncias alteradoras de comportamento.

Não vou falar aqui, por exemplo, dos químicos injetáveis ou inaláveis, naturais ou farmacêuticos, que levam ao vício, à desgraça e até à morte, quando o processo não é interrompido a tempo.
Não vou falar aqui dos exemplos de exageros que cada um de vocês, que conseguiu ler este texto até aqui, já deve ter visto na família ou que afligiram alguém próximo.
E, por fim, não vou falar aqui das consequências para a sociedade em forma de acidentes, trânsito, saúde pública, segurança e todos os outros setores que são atingidos quando as regras, as leis e as normas de convivência em público são esquecidas em função de uma alteração hormonal, induzida pela ingestão de um elemento químico acima da quantidade que o corpo humano consegue tolerar.

Pensei em tudo isso após ser tomado por algumas reações provocadas por um remédio para tratamento de problema dentário. Pude perceber claramente algumas reações cutâneas, musculares e até psicológicas, que por fim estavam descritas na bula. Acreditem: até uma série de 10 soluços consecutivos pôde ser atribuída à ingestão do comprimido, como está descrito naquele papelzinho de letras ínfimas que colocam na caixinha de remédio, com o único objetivo de te fazer correr para um oftalmologista por acreditar que não está enxergando direito.

Depois que o efeito passa, voltamos ao normal e, graças a Deus, nenhuma alteração é permanente — e a vida segue seu caminho.
Passada a emergência, em um segundo de lucidez, escrevo todo o texto acima despejado nestas letras e palavras, quando comparo ao ciclo natural da mulher.

Sim, a mulher possui (novamente, todos os seres vivos ao longo da vida) um ciclo hormonal de 28 dias (quando regulado), que provoca quase todos os sintomas das substâncias mencionadas até então.

E era sobre isso que eu gostaria de escrever, mas, em função do inflamado e alongado discurso supracitado, vai ficar para uma próxima coluna...